10.7.06

Madredeus e o Amor Português: A Espera!


Madredeus, Haja o que houver, O Paraíso, 1997.

Toda a gente diz que o Amor é saudade, esperança, desejo, sedução, entrega, sacrifício. Eu não. O amor é, no sentido português mais sebastianista, a Espera. O que é a espera? A espera é um contrato assinado por Deus entre duas almas que se amam. Espera-se por alguém que se ama e ela está longe, não volta, sente o mesmo por nós mas não vem, não volta, ou não quer. No Amor há calma. Na espera há ansiedade. O amor é um céu limpo ou com nuvens passageiras. A espera é um céu completamente enublado, que não deixa mostar um pouquinho de céu sequer. O amor é um rio que vai dar ao mar. A espera é um rio parado à espera que seja o mar a entrar por ele adentro. O amor é alegre, a espera é triste. Mas ambas felizes em todo o seu esplendor.

A pessoa que está longe espera voltar para junto de quem ama. Não importa. Espera-se. Esperar é coisa mais difícil de fazer nada vida. Vai-se vivendo, fazendo, acontecendo, trabalhando, construíndo, mas sempre sobre o signo astral da Espera. Esperar não é ter esperança. Esperar é acreditar sem ter qualquer tipo de esperança. Ter esperança é fazer algo para que aconteça; esperar é ficar parado à espera que aconteça.
Esperança é acreditar no Amor. Esperar é acreditar em Deus.

Para mim, a música mais bonita e que melhor representa a Espera é a Haja o que Houver dos Madredeus. Na bonita voz da Teresa Salgueiro e na sentida letra de Pedro Ayres Magalhães estão expressas toda a nossa alma, nervos, tripas e coração.

- "Haja o que houver/Eu estou aqui/Haja o que houver/Espero por ti."
Esta espera, terrível e lenta em que penhoramos o nosso coração ao tempo e à esperança de um dia, se Deus quiser, o nosso amor voltar, para estarmos juntos outra vez.

-"Eu estou aqui"/Eu espero por ti."
Só queremos que o tempo apresse e traga de volta quem nos deixou, quem se foi embora, quem disse adeus para sempre ou quem não teve sequer coragem para se despedir de nós. Está-se aqui. Espera-se.

-"Volta no vento meu amor/Volta depressa por favor."
Esperar e Desesperar são os dois pratos da balança sentimental portuguesa. Voltar é olhar para trás e ver que há alguém à nossa espera. O que enche mais o coração do que saber que há alguém à nossa espera?

-"Cada momento é pior/Volta no vento por favor."
Nada faz feliz a quem espera por alguém. Não dói, mas mói. Não há cura, porque não há doença. esperar é uma condição de quem espera, é uma maneira de ser, uma escolha, uma opção. Quem espera só quer estar junto de quem é esperado. Só isso. As pessoas andam, caminham, correm. Só há um meio de transporte para o amor voltar a quem pede o seu regresso. O vento.

-"Eu sei, eu sei/Quem és para mim/Haja o que houver/Espero por ti."
Eu amo-te. Eu conheço-te. Eu sei quem tu és para mim. E não importa o que aconteça eu espero por ti. Pela eternidade fora. Pelo nosso amor adentro. Por ti. O «eu» não existe para quem espera.

Amar é esperar. Só a separação, o afastamento, a saudade, permite a espera, a terrível espera. Só duas pessoas separadas uma da outra sabem o que cada uma é para si. A união, por mais felicidade que traga, nunca é tão sublime como o ligeiro afastamento, o medo de se perder quem se ama, que se vá embora e que nos deixe.

O amor liga duas pessoas. A espera liga duas almas gémeas.
Para sempre.
A verdadeira espera é para toda a vida.

1 comentário:

Nelson Mendes disse...

Sim, é isso e muito mais, eu sempre disse que tu percebes disto muito mais do que eu ;)Mas esperar alguém é um bocado doente, é não olhar para o lado, nem para a frente, nem para trás. Não se conhece ninguém, não se partilha, não há troca. É ficar parado. Mas é um tipo de amor na mesma. Foi só isso o que quis dizer..
Bjos