Lobo Antunes é um génio. Literário. Lobo Antunes é grande. É sério e leva a sério tudo o que faz e tudo o que diz. Lobo Antunes não ri muito, é certo, e quando ri é só para fazer ginástica aos cantos da boca. Se calhar Lobo Antunes não tem tempo para rir porque é um génio e os génios dedicam-se a actividades geniais contrárias ao riso tais como escrever, sobretudo escrever de forma genial sobre coisas geniais. Lobo Antunes corta as unhas de forma genial, faz a barba de forma genial e tira a remela dos olhos de forma genial. Todos os seus movimentos são geniais e a forma como ele pega na caneta para escrever - admitamos - também é genial. Aliás, a forma como ele se senta para escrever durante 10 horas a fio também é genial em si mesma, conseguindo até a proeza de não entortar a coluna evitando dores de pescoço.
A forma como fala é genial, porque consegue falar quase sem mover um único músculo da cara, atributo que é geralmente atribuído aos génios literários.
Nas entrevistas é duro e difícil de lidar com ele, porque é duro e difícel de lidar com génios, onde as palavras são arrancadas do fundo do pensamento porque um génio tem de ter pensamentos profundos, objecto de horas e horas de meditação e de leitura, com o intuito heróico de poder dizer palavras profundas e sobretudo citar autores desconhecidos.
Aliás, citar autores desconhecidos também é de génio, dá sempre um ar de erudição que fica sempre bem a todo o génio que se preze. Um génio tem que se portar como tal e dar a entender a toda a hora a razão essencial da sua genialidade.
Um génio, tal como nós, também dá os seus arrotos e solta os seus gazes depois de comer uma chispalhada bem picante, só que dá-lhes imediatemente um sentido literário que não está ao alcance da plebe.
Um «peido» não é só uma simples emissão dum gás mal-cheiroso, logo tem que ser objecto de uma meditação filosófica existencialista, assente numa lógica aristotélica de causa-efeito.
Um génio, por definição, é intocável, assentando vitaliciamente as nádegas no cadeirão de mármore do Olimpo. Não se pode falar mal dum génio, porque senão passa-se logo por burro ou, como se diz agora, iletrado. Não. Toda a gente que lê Lobo Antunes é e deve ser vista como genial, pois a leitura das suas obras emite um bálsamo de genialidade que abençoa e redime todo o fraco de espírito literário. Um génio literário limita-se a fazer aquilo que o faz ser genial: escrever livros. Um génio não vê televisão porque quem vê televisão é o povo analfabeto e os génios não querem ser confundidos com o povo (aliás, para quem publicam e de quem querem ganhar dinheiro).
Todos os dias, sem cessar, sem respirar, evitando ou adiando idas à casa de banho, ou remover um macaco do nariz, um génio deve dedicar-se à sua genialidade, um convívio autista e íntimo consigo mesmo e assumir uma pose genial, sem falhas, sem deixar cair a máscara.
Um povo é genial porque ler António Lobo Antunes é genial e porque Lobo Antunes é um génio.
Só um génio lê livros geniais escritos por génios. Não acham? Vá, lá, deixem esse mau génio....
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