31.8.11

Sobre o olhar! (desenho de Susana Nunes)

No primeiro dia em que ti vi, levaste-me os olhos.

Nunca mais vi os teus olhos.

No entanto, o teu olhar persegue-me para toda a vida.


Apaixono-me sempre pelo olhar e nunca pelos olhos.

Os olhos são bonitos mas o olhar é sempre triste.

Os olhos têm esperança, mas o olhar desespera.

Os olhos são inocentes, é o olhar que nos faz pecar.



Os olhos encontram-se, mas o olhar perde-se.


O amor está nos olhos, o desgosto está no olhar.


Um desgosto de amor é um luto que se faz por uma pessoa ainda viva.




(Para a Susana Nunes, por este fabuloso desenho)

17.8.11

Reading!


Manhattan

Se eu tivesse um sítio preferido para ir de férias (que não tenho) e que nunca tivesse visitado, esse sítio sería Manhattan. Desde os 18 anos que sonho viver em Manhattan. Sim, por causa dos filmes do Woody Allen. Gosto de prédios altos, muitas pessoas na rua, cheiro a jornais, combóios e jardins. Gosto também de Frank Sinatra, Tony Bennett. Moby e Diana Krall. Gosto de livrarias, lojas de discos em segunda mão, pequenos bares com clientes regulares e também gosto de bares a abarrotar de gente para ver stand-up comedy até de madrugada. Gosto do silêncio das manhãs e do barulho e confusão à noite. As tardes são um intervalo desnecessário. Só gosto do que é urbano, do que foi criado ou transformado pelo homem e nada do que é rural. Gosto de estradas e automóveis, não gosto de praias e coqueiros. A natureza é bonita mas só por 5 segundos, a partir daí é insuportável. Só a natureza humana é que é boa. Prefiro um café cheio de barulho a uma praia deserta. Prefiro um engarrafamento a uma estrada de terra batida no meio do monte. Quero lá saber dos passarinhos e do ar puro. Não gosto de mares, rios e outras águas. Gosto de piscinas, copos e cerveja com amigos. Gosto de água engarrafada, não gosto de ir beber àgua ao rio. Não gosto de pradarias e cavalos a correr e a relinchar. Gosto de universidades, shoppings cheios de gente e afins. Gosto de uma mulher bonita que passeia na rua com o último livro do Paul Auster debaixo do braço; não gosto de uma mulher que se levanta às 05h da manhã para ordenhar a vaca e anda todo o dia de galochas e forquilha. Prefiro o stress urbano à apatia ruminante do campo.

Manhattan sería o sítio ideal para eu viver. São gostos, claro. Pelas fotos que vejo parece ser uma cidade lindíssima. Não quero saber do clima, se é bom ou se é mau. Nova York é a cidade que nunca dorme e Manhattan o que é? Samuel Johnson dizia que quem está cansado de Londres está cansado de viver. Mas Manhattan, não. Acho que nunca me iría cansar. Se calhar, no dia em que fôr lá, vou desiludir-me, mas aí mudo de gostos e escolho outra cidade.

O campo é que nunca.

14.8.11

Pára de fazer barulho e abre o coração!

Ei! Pára lá de fazer barulho aí em cima! Sim, estamos cá em baixo, somos os teus vizinhos o casal de leões. Passas a noite a piar, a piar, e que tal se te fizesses à vidinha? Vais nos desculpar, mas isto de passar a noite a ter de levar com as tuas lágrimas em cima e os teus pios estridentes, é muito complicado. Em primeiro lugar estragas-me o penteado todo. Anda a minha senhora com o Babyliss a manhã inteira a alisar-me a juba para poder me apresentar condignamente aos meus súbditos e tu frisas-me todo pá! Se não fosses o meu conselheiro já te tinha mandado uma dentada.

Se há uma coisa que aprendi, é que fêmeas há muitas. Sim, também tive o meu primeiro grande amor, o que julgas? Não, não era a Ambar, a minha fofinha, era outra. Agora vou inverter um pouco os papeis e ouve o conselho que tenho para ti.
Dói, dói muito. O coração rasga-se no peito, o mundo fica sem sentido, a dor é tão grande que pedimos para morrer para que passe.

Mas sabes de uma coisa? Passa.

Não vale a pena andares a pensar no passado, enquanto o fizeres não vais conseguir avançar. Vais sempre comparar a tua "cujinha" a qualquer coruja que apareça. Abre o teu coração ferido, usa a inteligência que tens (Dostoievsky??!!) e dá uma oportunidade. Se não fosse assim a Ambar não estava ao meu lado. Uma vez o Puma disse-me uma coisa quando andava pelos cantos de juba frisada e olheiras de ressaca: "Um grande amor só se esquece com outro grande amor" Potente hã?? Potente e verdadeiro. Time to move on. Agora deixa-te lá de birras e amuos. E pelo amor da Santa: CALA-TE QUE QUEREMOS DORMIR!!

Texto de Susana Nunes.

13.8.11

Fazes-me falta! (desenho de Susana Nunes)

Hoje amuei. Nem me apetece falar, só fazer beicinho. Fico mais bonito assim? Não sei. Nem dizer um Bu-ú-ú. Também foi a única coisa que aprendi a dizer...Não estou para isso, não contem comigo. Hoje quero ficar num raminho, quietinho e de vez em quando esticar uma patinha, mas só para me espreguiçar. É assim, todos temos uma função neste vida.
Agora passo os dias a ver o National Geographic e leio um ou outro livro de Dostoievsky. Um génio incompreendido, digo eu. Levo uma vida contemplativa, gosto de ler policias, sobretudo. Às vezes leio o Harry Potter e, sim, tenho um poster da Hedwig na minha árvore. Ninguém é perfeito. Dou uma volta por aqui e acolá, assusto uma criança ou outra, mas volto sempre para este raminho. Páro para pensar. Não quero pensar. Onde andas meu amor?

A minha ex-namorada abandonou-me há muitos e muitos anos, pior, esqueceu-me. A verdade é que lhe disse para desaparecer da minha vida, mas como sou cobarde gosto sempre de pensar que eu é que sou a vítima. Procuro sempre saber onde ela está, quero vê-la mas não quero vê-la com ninguém nem quero que ela me veja sozinho. Tenho terror que ela descubra que sempre estive sozinho depois dela. «Já tive tantas depois de ti, baby, então não?, era sempre a aviar...»


Quería esquecê-la, mas não consigo. Como é que se esquece alguém que nos faz falta? A única maneira de dormir com o coração partido é varrer os cacos para debaixo travesseiro. Como durmo de dia, quando apareces nos meus sonhos é como se fosses um raio de sol, um anjo de luz. Não, não é isto que eu quero pensar, quero pensar mal de ti, chamar-te nomes, esqueceste-me foda-se, mas não consigo. Só consigo ficar triste, amuar e fazer beicinho. Os tolos zangam-se, os sábios entristecem, respiram fundo e aceitam. Quero ser sábio. Mas não quero carinho, nem consolo, nem colinho, nem miminhos. Não preciso. Era o meu primeiro amor, queria que ela fosse a minha primeira coruja, a minha «cujinha», mas ela não quis. Dizia que eu era imaturo, muito reservado, falava pouco e que não gostava de sair e que não fazia festas de aniversário, que nunca lhe dava flôres e que os ratinhos que lhe dava eram muito magritos, eu sei lá. Para mim não deu mais. Ela também tinha defeitos e quando lhos disse não gostou. Não percebias linda? Eu amava os teus defeitos, só que é que os via, quando tu procuravas escondê-los de toda a gente. Só eu amava o teu lado menos bom, os teus humores azedos, o teu sarcasmo inteligente.

Desaparece, disse eu. Se é isso que tu queres, disseste, nunca mais vais saber nada de mim.

E nunca mais a vi. E nunca mais soube nada.

Ficou uma espécie de saudade, dentro de mim ainda brigamos muito e fazemos sempre as pazes depois.

Os meus sonhos são sempre felizes, é assim que vou enganando os dias. Não quero saber se ela pensa em mim. Pensar nela faz-me feliz, só quando tento esquecê-la é que amuo.

Hoje amuei.

Tou farto de estar amuado, um dia zango-me.

Foda-se.

1.8.11

Dito dos padres do deserto

"Se o Homem não fala a seu coração: 'Deus e eu estamos sozinhos no mundo', nunca encontrará descanso", dizia o Abade Alônio. In Ditos dos Padres do Deserto.