
Ainda sou do tempo em que a distância, o silêncio, a ausência, a expetativa, e um certo tédio também, faziam não só parte da vida mas eram os cimentos de qualquer relação social dita normal. Era suposto estarmos juntos e separarmo-nos durante um tempo, sem sabermos nada uns dos outros para depois, então, reencontrarmo-nos para matar saudades e recomeçar.
Não é suposto sabermos tudo a todo o tempo de toda a gente que se conhece. George Orwell, no famoso livro 1984, já nos tinha alertado para o fato de uma sociedade onde tudo é transparente é uma sociedade totalitária.
O que é que nos move para isto então?
Será a vontade de ser popular? Ser famoso? Ser visto ou ser relembrado? Encontrar ex-namoradas ou amigos da primária? Fazer novos amigos? Andar à «caça»? Causar inveja social, do tipo: «Eu estou aqui! Eu estou aqui! Ó para mim nesta praia em Cancún, a fazer um menáge com golfinhos, enquanto equilibro uma caipirinha nos queixos!» Será concerteza tudo isto e mais do que fazer amigos, os frequentadores do FB querem um auditório atento e um público com um QI suficiente para se deixar impressionar pelas fotos da lua de mel no México.
A meu ver, a resposta mais imediata é esta: O que move o ser humano mais incauto a chafurdar nestas lamas infetas do FB é, pura e simplesmente, o terror ao anonimato.
O FB institucionalizou a noção de que não é suposto haver solidão nas sociedades democráticas ocidentais, de que não é suposto estarmos sozinhos quando estamos em casa e, pior ainda, por mais entediada que esteja a nossa condição, que temos que estar a toda a hora contatáveis e disponíveis para estar a ver os outros e sermos vistos por eles.
Toda a gente tem o terror de desaparecer do radar, de não ver e de não ser visto, de passar despercebido, de não chamar a atenção - mais do que ver o que os «outros» (amigos ou não) andam a fazer, nós queremos principalmente é que nos vejam a nós, que saibam de nós, que ainda fazemos parte deste planeta e que gostamos de ir à praia tirar fotos ao mar. Fazemos tudo e mais alguma coisa para chamar a atenção de todos e para que não se esqueçam de nós. É este terror ao anonimato, este medo de desaparecer e de que se esqueçam de nós que leva a que todos nós façamos um esforço igual para nos lembrarmos dos outros e lembrar-lhes (pondo sempre um «like» em qualquer porcaria que ponham lá) que também nós não nos esquecemos deles. Para quem não tem vida social, resta-lhe a virtual, o voyerismo doce de olhar para os outros e no outro lado do espelho nos vermos a nós próprios.
O FB serve, como todas as redes virtuais, para nos lembrar que não estamos sozinhos quando no fundo estamos. É como estar num café ou ir para o centro comercial só para ver pessoas. Saimos do café, do shopping e vimos para casa com a mesma conclusão com que fechamos a página do FB: que não fizemos um único amigo de verdade. Mas todos nos vêmos uns aos outros e todos sabemos os que uns e outros andaram a fazer nos últimos dias.

São os (as) Facebookianos(as).
O (A) Facebookiano (a) é um(a) homem/mulher-estátua que ao invés de estar no jardim a levar com cagadelas dos pombos, está em frente a um computador a levar com a merda dos outros. É um pequeno big-brother de trazer por casa, é uma porteira de prédio ligada à web, e que quer viver dentro de nós e impedir-nos de fazer amigos e namoradas de verdade para, lentamente, nos transformar a todos em estátuas amorfas e sem vida. Um Facebookiano só não ganha musgo nos pés e verdete nas virilhas porque de vez em quando tem que levantar a peida da cadeira para ir ao frigorífico comer o resto da lasanha. Já estivemos mais longe disto...
Como tal, e num rasgo de imaginação criativa, façamos já uma estátua em homenagem ao (à) Facebookiano (a) do futuro em todos os jardins do país. Nada de muito exagerado: um ser obeso, sentado numa cadeira, em frente a um PC, com uma expressão facial a demonstrar tédio, a mão direita no rato e a esquerda a coçar as virilhas.
Depois é só deixar que os pombos tratem do resto.